Música, por algumas definições, pode ser compreendida como a arte de se exprimir por meio de sons. Embora nem sempre seja feita com esse objetivo, a música pode ser considerada como uma forma de arte — e talvez seja sua principal função. Por metonímia, é um conjunto de vocais, instrumentais ou mecânicos com ritmo, harmonia e melodia. Olhando por esses espectros, qualquer um de nós é capaz de fazer música, seja de forma organizada ou improvisada, pensada ou não.

Mas hoje a gente destaca a importância de fazer música sem tanto compromisso, sem se importar unicamente com seu resultado final ou com o que os outros vão pensar. Música pelo simples fato de se fazer música. Música experimental. Isto porque se desconectar de cobranças e de concepções tradicionais pode fazer com que nossa criatividade fique mais aguçada e possamos assim extrapolar nossos próprios limites.

Existe uma frase de John Cage, compositor musical experimentalista norte-americano, referência no contexto histórico, que diz: “Não consigo entender por que as pessoas têm medo de ideias novas. Eu tenho medo das velhas”, e é verdade, por quê ficamos tão assustados com o novo? Música não precisa ser feita apenas da forma convencional, é possível fugir do óbvio a partir do sopro do vento ou de uma frequência emitida de maneira errada, afinal, “uma ação experimental é resultado de algo que não está previsto”.

Por aqui, a música experimental fincou raízes a partir da década de 1950, com a ascensão do grupo Música Nova, encabeçado por compositores de São Paulo como Rogério Duprat — que em seus arranjos misturava sons de berimbau, guitarra e ruídos eletroacústicos. Por muito tempo não se soube quem são ou como trabalham os artistas brasileiros de música experimental, então um pesquisador português chamado Rui Chaves criou a plataforma online Nendú, com dados de mais de 100 artistas brasileiros que fazem esse tipo de música.

Os equipamentos criados por engenheiros de som franceses e alemães, em meados do século 20, como os sintetizadores, ajudaram a dar novos rumos à forma como se produz e pesquisa música, mas podemos sempre ir além. É possível, inclusive, transformar os toca-discos em instrumentos, como faz Otomo Yoshihide, mestre japonês da música experimental.

Compor atmosferas com uma combinação entre ruídos e fragmentos, projetando um cenário abstrato e sem se comprometer com métricas padrões de arranjo e estrutura, também são características do experimentalismo. Dentro do cenário eletrônico underground, alguns artistas têm desenvolvido apostas em sons que ressoam essas características mais assimétricas e de certa forma imersivas e viajantes, que convidam o ouvinte a adentrar em uma verdadeira experiência frequencial.

Em seu mais recente álbum, por exemplo, Alex Justino, um dos maiores expoentes do Techno nacional, viu-se na necessidade de compor faixas que vão além do conceito voltado para o dancefloor, e apostou no experimentalismo de paisagens sonoras mais indefinidas. “Reflection” é um experimento multisensorial, especialmente visível nas primeiras faixas do álbum, onde o produtor reúne fragmentos sonoros industriais com texturas cinemáticas que se entrelaçam formando um cenário sci-fi e conectivo.

Outro grande apostador do conceito experimental é o projeto paulistano Objeto Amarelo comandado por Carlos Issa, que desde 1999 vem apresentando um jogo sonoro através de um estúdio portátil – por onde sintetiza todos os instrumentos através de quatro canais – com colagens e combinações de ruídos que promovem múltiplas sensações de surrealismo dentro de um combo de influências distintas.

Desapegar da forma tradicional de produzir música e experimentar novos caminhos, pode ser muito útil no processo de criação. Então, por que não tentar?